Jair Bolsonaro durante a comemoração do Dia do Exército em 2019. | Foto: Presidência da República
Após o indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e de outras 36 pessoas pela Polícia Federal (PF) sob a acusação de envolvimento em um suposto golpe de Estado, o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF), receberá o relatório de aproximadamente 800 páginas. A próxima etapa será o envio do documento à Procuradoria-Geral da República (PGR) para análise.
A PGR terá um prazo de 15 dias para decidir entre arquivar o caso, apresentar uma denúncia ou solicitar novas investigações. Dessa forma, a análise inicial poderá ser concluída antes do recesso do Judiciário, previsto para começar em 20 de dezembro. A expectativa é que o procurador-geral, Paulo Gonet, apresente uma denúncia, embora ela só deva ser formalizada no próximo ano.
“O indiciamento marca uma etapa preliminar do processo. A partir daí, cabe à PGR avaliar se há provas suficientes para oferecer denúncia, o que pode resultar na abertura de um processo criminal. Por enquanto, ninguém é réu ou está sendo processado, pois ainda estamos na fase investigativa”, esclarece o advogado constitucionalista André Marsiglia.
Beatriz Alaia Colin, advogada especializada em Direito Penal, destaca que o indiciamento pela Polícia Federal não obriga a PGR a apresentar uma denúncia contra Bolsonaro ou os outros envolvidos no caso.
A Polícia Federal apontou a existência de indícios e elementos que indicam o envolvimento das pessoas indiciadas nos crimes de organização criminosa e atentado contra o Estado Democrático de Direito. No entanto, conforme explica a advogada Beatriz Alaia Colin, o Ministério Público não está vinculado à lista de indiciados e formulará suas denúncias com base em sua própria análise sobre a participação dos envolvidos nos atos investigados.
Caso a Procuradoria-Geral da República (PGR) apresente uma denúncia, caberá ao Supremo Tribunal Federal (STF) decidir se a aceita ou não. Se aceita, Jair Bolsonaro e os outros 36 indiciados passarão a ser réus no processo.
Sobre o indiciamento realizado pela Polícia Federal, Bolsonaro comentou ao portal Metrópoles, criticando a condução do inquérito pelo ministro Alexandre de Moraes. “O ministro conduz todo o inquérito, ajusta depoimentos, prende sem denúncia, faz pesca probatória e conta com uma assessoria bastante criativa. Faz tudo o que a lei não prevê”, declarou em uma postagem na rede social X.
Bolsonaro também afirmou: "Preciso analisar o conteúdo desse indiciamento. Vou aguardar meu advogado. Esse caso será encaminhado à PGR, onde a disputa realmente começa. Não espero nada diferente de uma equipe que usa da criatividade para tentar me incriminar".
O advogado constitucionalista Fábio Tavares destacou que a "narrativa propagada carece de provas concretas" e que a imputação de crimes aos indiciados pode enfraquecer o Estado de Direito.
"Essas acusações não apenas abalam o Estado de Direito, mas também colocam em risco a estabilidade democrática. Quando instituições públicas são utilizadas para sustentar narrativas de cunho político, a credibilidade do sistema legal é comprometida", declarou Tavares.
Sobre a possibilidade de prisão preventiva do ex-presidente Jair Bolsonaro, o jurista André Marsiglia avaliou que tal medida seria uma "ilegalidade", argumentando que não há ameaças que justifiquem tal ação.
"A prisão preventiva de Bolsonaro configuraria uma ilegalidade, já que sua finalidade principal é evitar ameaças à ordem pública. Como os fatos em questão ocorreram em 2022 e ele não ocupa mais nenhum cargo de liderança, não há motivos plausíveis para que seja preso neste momento", explicou Marsiglia.
Crimes apontados pela PF no indiciamento
A Polícia Federal incluiu o ex-presidente Jair Bolsonaro e mais 36 pessoas em seu relatório, acusando-os de três crimes: golpe de Estado, cuja pena varia entre 4 e 12 anos de prisão; abolição violenta do Estado Democrático de Direito, com penas de 4 a 8 anos; e organização criminosa, cuja punição pode variar de 3 a 8 anos de reclusão. Todos os 37 indiciados foram acusados de cometer os três delitos.
No caso dos dois primeiros crimes mencionados, a PF sustenta que Bolsonaro e os demais infringiram a Lei 14.197/2021. Essa legislação, sancionada pelo próprio ex-presidente durante seu mandato, substituiu a antiga Lei de Segurança Nacional (LSN).
A nova legislação, em seu artigo 359-L, tipifica como crime "tentar, mediante violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais". Já o artigo 359-M define como crime "tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído".
Quanto à terceira acusação, a Polícia Federal baseia-se na Lei 12.850/13, conhecida como Lei de Organização Criminosa. O artigo 2º dessa lei caracteriza como crime "promover, constituir, financiar ou integrar, direta ou indiretamente, uma organização criminosa".
Para o advogado Fábio Tavares, as acusações do indiciamento carecem de fundamentos objetivos e provas que as sustentem. "A tipificação desses crimes exige atos concretos e evidências consistentes. Um golpe de Estado, por natureza, implica o uso de força, armas, controle de instituições-chave e ruptura violenta com a ordem democrática. Porém, nada disso foi comprovado", afirmou.
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